PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2017.0000235554
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2258532-90.2016.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante IGREJA CRISTÃMARANATA, são agravados FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA,TWITTER BRASIL REDE DE INFORMAÇÕES LTDA., YAHOO DO BRASIL e ENDURANCE GROUP BRASIL HOSPEDAGEM DE SITES LTDA. – HOSTGATORBRASIL.
ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores FRANCISCOLOUREIRO (Presidente) e CHRISTINE SANTINI.
São Paulo, 6 de abril de 2017.
Rui Cascaldi
Relator
Assinatura Eletrônica
VOTO Nº: 36930
AGRV. Nº: 2258532-90.2016.8.26.0000
COMARCA: SÃO PAULO
AGTE. : IGREJA CRISTÃ MARANATA
AGDO. : FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA, TWITTERBRASIL REDE DE INFORMAÇÕES LTDA, YAHOO DO BRASIL e ENDURANCEGROUP BRASIL HOSPEDAGEM DE SITES LTDA – HOSTGATOR BRASIL
JUIZ : MARCIA TESSITORE
TUTELA PROVISÓRIA – Ação de obrigação de fazer – Pretensão inibitória – Decisão que indeferiu pleito de exclusão de conteúdos disponibilizados em páginas cujos endereços eletrônicos (URL’s) foram identificados na petição inicial – Texto que contém relatos e opiniões desfavoráveis à entidade religiosa autora, tanto em seu aspecto doutrinário quanto institucional – Inconformismo da demandante – Não acolhimento – Caráter abusivo e ofensivo dos conteúdos em questão que não pode ser inequivocamente afirmado – Decisão interlocutória mantida – Recurso não provido.
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, nos autos de ação de obrigação de fazer, deferiu apenas parcialmente tutela provisória, para determinar que as rés forneçam os dados cadastrais disponíveis dos usuários, bem como os registros eletrônicos(números de IP de origem, com datas e horários GMT) referentes à criação, modificação, acessos e postagem de conteúdo e publicações referidas na peça inicial. Foi rejeitado, contudo, o pleito liminar de remoção dos conteúdos disponibilizados nas URL’s (endereços eletrônicos) identificadas na exordial. Recorre a autora, sustentando, em síntese, que tomou conhecimento que páginas eletrônicas de autoria anônima por meio das quais é veiculado conteúdo inverídico e ofensivo às suas crenças, ensinamentos e lideranças. Aduz haver extrapolação da direito de livre expressão constitucionalmente garantido. Alega que as páginas em questão são providas por serviços de hospedagem da corré HOSTGATOR, bem pelo fórum “Tumblr”, de responsabilidade da corré YAHOO, além de se servirem de perfis falsos e grupos criados nas redes dos também demandados FACEBOOK e TWITTER. Requer a reforma da decisão interlocutória agravada, para que seja deferida a tutela de urgência pleiteada, de modo a se determinar às demandadas, mediante ofício, a supressão do conteúdo reputado ofensivo, em prazo não superior a cinco dias, sob pena de multa diária de cinco mil reais. Efeito ativo indeferido (fl. 713).
Recurso processado com resposta.
É o relatório.
No caso em tela, afirma a autora IGREJA CRISTÃMARANATA, que desconhecidos, por meio de páginas na internet hospedadas pela corré HOSTGATOR e de perfis falsos no fórum virtual “Tumblr”, administrado pela ré YAHOO, e nas redes sociais FACEBOOK e TWITTER, passaram a veicular conteúdo explicitamente desfavorável à instituição religiosa demandante. Mencionam tais páginas, exemplificativamente, que a IGREJA MARANATA estaria envolvida em escândalos, que articularia demandas judiciais inconsequentes, que seria administrada por uma “elite palaciana”, propagadora de “governo megalomaníaco e pseudocarismático” e instigadora de ódio contra aqueles que a questionam. Questionam os autores dos textos o que chamam de “gedeltismo” (alusão ao presidente da IGREJA, Pastor Gedelti Gueiros), considerando-o um mal a ser extirpado. Tecem críticas às práticas religiosas da MARANATA, que segundo eles se aproximariam de “cultos proféticos”, afastando-se das ideias cristãs e dos ensinamentos das “Escrituras Sagradas”.
Primeiramente, cumpre salientar que embora a eventual burla, por parte dos autores dos conteúdos, dos limites dos direitos de informação e opinião, remeta a questão de alta indagação no processo, tocando, diretamente, ao mérito da ação obrigacional, vislumbra-se acertado o indeferimento da antecipação de tutela no tocante ao pleito de exclusão de postagens.
Em cognição sumária dos elementos ora disponíveis, não é possível ainda se afirmar que os fatos narrados nas mensagens e textos são falsos ou que os autores das postagens tenham incorrido em algum abuso, tudo mais se afigurando aproximar de uma crítica, compreendida, a princípio, no exercício legítimo do direito de manifestação constitucionalmente garantido (art. 5º, IV, da Constituição Federal).
Bem se percebe, ao menos em análise inicial, que muitos dos textos parecem refletir o descontentamento de seus autores, provavelmente antigos fiéis da IGREJA recorrente, tanto no aspecto espiritual, relativo à doutrina por esta propagada, algo extremamente pessoal, quanto no aspecto organizacional da entidade, revelando profundo desapontamento decorrente especialmente do notório envolvimento de alguns dos dirigentes em práticas ilícitas algo que, inclusive, foi objeto de cobertura midiática à época dos acontecimentos.
Ou seja, ao menos em cognição sumária, os conteúdos cuja exclusão se discute não se vislumbram voltados especificamente à mácula da honra objetiva da agravante, embora lancem mão de expressões fortes e, por tocarem em questões deveras delicadas, como a convicção religiosa, acabam sendo capazes de causar desconforto naqueles que não compartilham o mesmo ponto de vista. Não se reputa, assim, cabível sua supressão simplesmente pelo fato de retratarem opiniões desfavoráveis à recorrente, sob pena de se afrontar principalmente os direitos fundamentais do cidadão comum à informação e à manifestação do pensamento, que devem estar imunes a qualquer tipo de censura. Em suma, não evidenciada a probabilidade do direito invocado pela autora agravante, deve ser mantida a decisão interlocutória agravada.
Diante do exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso.
RUI CASCALDI
Relator