Queixa-crime rejeitada

AP nº 0006472-59.2013.8.08.0035

Querelante: Gedelti Victalino Teixeira Gueiros
Querelado: Lucas Avila de Araujo
Infração: Art. 139 do CPC

DECISÃO

Vistos etc.

Trata-se de queixa-crime apresentada pelo querelante Gedelti Victalino Teixeira Gueiros em desfavor do querelado Lucas Avila de Araujo, estando as partes devidamente qualificadas na peça inaugural, para apuração e processamento da suposta prática do crime de difamação, previsto no art. 139 do Código Penal.
Citação válida às fls. 90-verso.

Audiência de Instrução e Julgamento às fls. 93, em que não logrou êxito a tentativa de conciliação. Proposta transação penal pelo Exmo. Dr. Promotor de Justiça, foi recusada pelo querelado. Ato contínuo, a Douta Patrona do querelado requereu prazo para apresentação de Resposta à Acusação, tendo em vista a proximidade da citação e realização da mencionada audiência, o que foi deferido.

Resposta à queixa-crime às fls. 94/158 requerendo a absolvição sumária do querelado, bem como a extinção do processo sem resolução do mérito em razão da inépcia da inicial.

Petição do querelante às fls. 179/188 manifestando-se quanto a resposta à queixa-crime, bem como requerendo o regular prosseguimento do feito.

Parecer Ministerial às fls. 191/196 requerendo a rejeição da queixa-crime, nos termos do art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal.

Analisados os elementos havidos nos autos,

DECIDO.

A presente ação penal originou-se através de depoimento prestado em investigação criminal promovida pela Polícia Federal, que intimou o querelado para prestar esclarecimentos, na qualidade de testemunha.

Consta na queixa-crime que o querelado, em depoimento na qualidade de testemunha, perante Delegado de Polícia Federal, se afastou de seu papel informativo, passando a rogar inúmeras ofensas através de narrativas mentirosas de fatos que não guardavam qualquer relação com os crimes investigados, com a clara intenção de difamar o querelante.

Cabe registrar que, no caso dos crimes contra a honra, em especial o delito de difamação, previsto no artigo 139 do Código Penal, é imperioso que se constate a existência de, além do dolo, um fim específico, consistente na intenção de macular a honra alheia, somente se configurando a tipicidade subjetiva do mencionado delito se presente o “animus diffamandi”.

Neste mesmo sentido, lecionam os Doutrinadores:

“O dolo é a vontade de imputar, atribuir fato desonroso a alguém, seja verdadeiro ou não. Exige-se, porém, o animus diffamandi, elemento subjetivo do tipo, que ‘se expressa no cunho de seriedade que o sujeito imprime à sua conduta.’ Inexiste o delito, pois, quando o agente atua com animus jocandi, narrandi, consulendi, defendenti etc. Decidiu-se pela inexistência do crime na crítica desfavorável, desenvolvida em linguagem elevada e serena, nas informações prestadas sobre a idoneidade alheia, fornecendo declaração pública desabonadora de quem foi convidado pela Justiça para prestá-las, nas palavras desabonadoras de empregado, no interesse exclusivo da empresa e na explosão emocional ocorrida em acirrada discussão.”

(MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, vol. 2. 30ª Edição. Parte Especial, arts. 121 a 234-B do CP. São Paulo. Editora Atlas. 2013. Pág.s 137/138).

“25-A. Narrativa de testemunha: não configura o crime de difamação se a testemunha se limita a expor, na sua ótica, sob animus narrandi, o que lhe foi indagado pelo juiz, ainda que implique em considerações desairosas sobre alguém. É o que já decidiu o STJ: ‘É desprovida de justa causa a ação penal proposta contra testemunha que, sob o compromisso legal de dizer a verdade, limita-se a narrar, objetivamente, os fatos como tidos ofensivos a honra dos quais tomou conhecimento, no intuito de responder as perguntas que lhe foram propostas’ (HC 10.62-GO, 6ª T., rel. Vicente Leal, 17.08.2000, v.u., DJ 04.09.2000, p. 198).”

(NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado. 10ª Edição. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2010 .Pág. 680).

Assim, antes do recebimento da peça acusatória, deve-se verificar se a conduta do querelado revestiu-se de intenção difamatória, requisito mínimo para prosseguimento do feito. Em caso negativo, é inviável a instauração de ação penal, com todos os tramites legais, que ao final seria julgada improcedente.
Na queixa-crime, o querelante individualiza a conduta do querelado apontando as supostas ofensas rogadas contra si:

“QUE ouviu dizer que GEDELTI possui uma residência em BalHarbor, Miami, Flórida/EUA; QUE através de ANTÔNIO CARLOS RODRIGUES DE OLIVEIRA, integrante da comissão executiva da ICM, ficou sabendo que GEDELTI informou à comissão que se ausentará do Brasil, juntamente com a família, por conta das investigações que estão apurando as fraudes na ICM; QUE segundo ANTÔNIO CARLOS, GEDELTI pretende se refugiar nos EUA, tanto é, que sua família já se encontra naquele país; (…) QUE o conselho servia para as decisões fossem tomadas em colegiado, mas na prática, eram decisões impostas por GEDELTI;”

Ao analisar todo o termo de depoimento prestado na Polícia Federal, documento este trazido pelo querelante às fls. 23/28, observa-se que o querelado respondeu a diversos questionamentos feitos pelo Dr. Delegado Federal a fim de obtenção de provas para desvendar suposta ocorrência de infração penal, porém em momento algum houve a intenção deliberada de causar dano à outra parte.

Este também é o entendimento firmado pela Exma. Dra. Promotora de Justiça, que não vislumbrou “justa causa para instauração de ação penal em face do querelado, eis que este, em momento algum, revestiu-se de intenção difamatória ao querelante, mas sim, apenas respondeu as questões formuladas por aquela Autoridade Policial, num ambiente em que, tão somente, buscavam-se elementos para apuração de suposta prática de ilícito”, conforme parecer às fls. 191/196.

Diante do contexto fático apresentado, agiu o querelado em evidente “animus narrandi”. Ora, o querelado atendeu ao chamado do Dr. Delegado de Polícia Federal, respondendo perguntas dentro daquilo que foi questionado durante depoimento realizado na esfera policial, tendo o mesmo se compromissado a dizer a verdade do que souber ou lhe for perguntado.

Desta feita, não há indícios mínimos a fim de fundamentar a instauração de processo criminal por difamação em face do querelado, uma vez que a conduta praticada pelo mesmo revela-se atípica, ensejando na rejeição da queixa-crime intentada em seu desfavor.

Assim também é a jurisprudência dominante:

HABEAS CORPUS. DENÚNCIA POR CALÚNIA E DIFAMAÇÃO CONTRA JUIZ DE DIREITO. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. NARRAÇÃO DE FATOS EM PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS INSTAURADOS PERANTE O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. NOTÓRIO ANIMUS NARRANDI. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO CRIMINAL. DENÚNCIA REJEITADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA.

1. No caso, o Paciente, Juiz de Direito, em declarações manifestadas em procedimentos instaurados perante o Conselho Nacional de Justiça, limitou-se a descrever fatos, com o nítido propósito de informar possíveis irregularidades nos atos administrativos que determinaram sua remoção para comarcas muito distantes daquela em que atuava.

Assim, a conduta do Denunciado não viola a honra das supostas vítimas, nem lhes atribui fato específico definido como crime.

2. A denúncia deve estampar a existência de dolo específico necessário à configuração dos crimes contra a honra, sob pena de faltar-lhe justa causa, sendo que a mera intenção de caçoar (animus jocandi), de narrar (animus narrandi), de defender (animus defendendi), de informar ou aconselhar (animus consulendi), de criticar (animus criticandi) ou de corrigir (animus corrigendi) exclui o elemento subjetivo e, por conseguinte, afasta a tipicidade desses crimes.

3. A denúncia em análise não traz consigo a demonstração do elemento volitivo ínsito à conduta criminosa, ou seja, a inicial acusatória não evidencia a existência de dolo específico necessário à configuração dos crimes contra a honra, razão pela qual resta ausente a justa causa para o prosseguimento da persecução criminal.

4. Ordem de habeas corpus concedida para determinar o trancamento da ação penal n.º 23020/2010 instaurada contra o Paciente.

(STJ, HC 234134/MT, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 06/11/2012, DJe 16/11/2012).

Assim sendo, diferente do que foi alegado na inicial acusatória, observo que o depoimento prestado pelo querelado não contém declarações direcionadas à ofensa da honra alheia, visto que este possuía apenas o “animus narrandi “.

Diante do exposto, tendo em vista a ausência de justa causa para prosseguimento do feito, REJEITO A QUEIXA-CRIME, com fulcro no artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal, e determino o ARQUIVAMENTO do presente feito, com as formalidades de estilo e anotações no E-JUD, após o transito em julgado desta Decisão.

Publique-se e Registre-se.

Intimem-se as partes, por intermédio de seus Doutos Advogados, através do Diário Oficial.

Notifique-se a Exma. Dra. Promotora de Justiça.

Vila Velha/ES, 24 de abril de 2014.

Regina Maria Corrêa Martins

Juíza de Direito

….

Juiz : REGINA MARIA CORREA MARTINS
Dispositivo : Isto posto, NÃO CONHEÇO do Recurso de apelação interposto pelo Querelante, visto que intempestivo.
Decisão : 

PROCESSO Nº 0006472-59.2013.8.08.0035

Querelante: Gedelti Victalino Teixeira Gueiros

Querelado: Lucas Avila de Araújo

DECISÃO

Vistos etc.

Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Querelante, por intermédio de sua Douta Advogada, que se insurge contra a Decisão às fls. 198/202, que rejeitou a queixa-crime, com fulcro no art. 395, inciso III, do CPP.

Estando presentes os pressupostos de cabimento e adequação recursal, bem como o interesse, a legitimidade recursal e o preparo, passo à análise da tempestividade.

De acordo com o art. 82, §1º , da Lei n° 9.099/95, o recurso contra a Decisão supracitada será interposto no prazo de dez dias, contados da ciência do ato Judicial. Apresentado o recurso fora deste prazo legal, tem-se o reconhecimento da intempestividade.

Denota-se dos autos que o Querelante foi devidamente intimado, através de sua Advogada, via Diário Oficial, no dia 13/05/2014, conforme fls. 203 e 220.

Realiza-se a contagem do prazo recursal conforme a regra do art. 184 do CPC, excluindo o dia do começo e incluindo o dia final. Assim, o prazo de dez dias para o Querelante apresentar seu recurso começou a contar em 14/05/2014, quarta-feira, e findou-se em 23/05/2014, sexta-feira.

Porém, o Recorrente apenas apresentou o recurso em apreço em 08/07/2014, conforme petição de interposição às fls. 205/206.

Assim, uma vez apresentado o recurso fora do prazo legal, resta clara a ausência de pressuposto recursal.

Ainda, no bojo do Recurso, a Douta Advogada do Querelante informou que somente foi intimada da Decisão de arquivamento em 18/06/2014, quarta-feira. Considerando que os dias 19/06/2014 (quinta-feira) e 20/06/2014 (sexta-feira) foram feriados, sem expediente forense, o prazo recursal somente se iniciou em 23/06/2014, segunda-feira.

Mesmo que fosse desconsiderada intimação editalícia, o recurso do Querelante continua intempestivo, uma vez que o prazo considerado pela Douta Advogada se findou em 02/07/2014, quarta-feira.

Isto posto, NÃO CONHEÇO do Recurso de apelação interposto pelo Querelante, visto que intempestivo.

Publique-se e registre-se.

Intimem-se as partes, através de seus Advogados, via Diário Oficial.

Após, diante do trânsito em julgado da Decisão que determinou o arquivamento do feito, arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo, procedendo-se com as devidas anotações no sistema eletrônico E-JUD.

Vila Velha/ES, 27 de agosto de 2014.

Regina Maria Corrêa Martins

Juíza de Direito