A Parábola das Muitas Moradas

“Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim.

Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar.

E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também.

Mesmo vós sabeis para onde vou, e conheceis o caminho.

Disse-lhe Tomé: Senhor, nós não sabemos para onde vais; e como podemos saber o caminho?

Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim.” João 14:1-6

“As preciosas palavras da primei­ra metade desse trecho, referentes aos santos de todas as épocas, foram proferidas por Jesus quando conver­sava com os seus discípulos, na se­mana que antecedeu sua crucificação. Judas, o traidor, deixara o grupo; por isso, Jesus significativamen­te usou o singular, embora refe­risse a onze homens: “Não se turbe o vosso coração”. Com Judas fora do caminho, houve unidade entre os remanescentes, os quais formaram um só coração.

As constantes menções da proxi­midade de sua morte (de Jesus) perturbaram profundamente os amados discípulos. Eles não conse­guiam imaginar o futuro sem aque­le que se tornara o centro de todas as coisas na vida deles. Agora ele os deixaria, e o futuro seria som­brio e preocupante. Muitas vezes Jesus falava em partir. Para onde e por que iria embora? Então ele falou: “Para onde vou, vós não podeis ir”. Mas a promessa era que finalmente eles o seguiriam e es­tariam ao seu lado, onde ele estivesse: “Para que onde eu estiver, estejais vós também”. Quatro dos perplexos discípulos falaram e na sequência Cristo deu-lhes (e à igreja de todas as épocas) a mais acalentadora parábola sobre a vida no céu:

 Pedro indagou: “Para onde vais?”

Tomé perguntou: “Não sabemos para onde vais. Como pode­mos conhecer o caminho?”

Filipe inquiriu: “Mostra-nos o Pai, e isso nos basta”.

A interrogação de Judas (não o Iscariotes) foi: “Por que pretendes manifestar-te a nós, e não ao mundo?”

 Esses quatro homens, profunda­mente perturbados quanto à proximidade da partida de Cristo, apro­ximaram-se daquela hora pavorosa por ângulos diferentes.

Pedro sabia, há meses, que Jesus morreria. Seu questiona­mento, no entanto, vai além do túmulo. O que ele queria saber era algo sobre o misterioso além. Para onde ia Jesus?

Tomé estava mais perplexo quan­to ao caminho para a futura morada que Jesus prepararia aos seus san­tos. Se ele não sabia para onde Je­sus ia, como poderia segui-lo?

Filipe, em sua peculiar caracte­rística, serenamente tratou da pro­funda verdade da revelação divina. Sua preocupação não era tanto a morada, mas o Ser augusto cuja pre­sença a encheria. “Mostra-nos o Pai, e isso nos basta”. Jesus em sua res­posta afirmou ser a manifestação do Pai: “Quem me vê, vê o Pai”. Ele era a expressão máxima da revelação do Pai. Se os homens quisessem saber como era Deus, tudo o que tinham de fazer era pensar nas obras, pala­vras e caminhos de seu Filho.

Judas (não o Iscariotes), de ma­neira prática, pensou no tempo pre­sente, e quis saber se a revelação dada aos discípulos seria comparti­lhada com o mundo, depois que Jesus os deixasse. Ele estava fora des­ses questionamentos que refletiam a tristeza geral, quando Jesus decla­rou a cura tríplice dos corações tur­bados de seus discípulos.

Em primeiro lugar, eles deveri­am ter fé em Cristo: “Crede também em mim”. Os discípulos, como ju­deus, acreditaram o tempo todo no Deus das alianças; mas, de certo modo, Jesus começava a lhes decepcio­nar o coração. Um eco de sua profunda decepção foi ouvido no ca­minho de Emaús: “Nós esperávamos que fosse ele quem redimisse a Isra­el” (Lc 24:21). Eles procuravam um poderoso Messias que os livrasse da tirania e opressão do governo roma­no, e aqui estava o Cristo, que mor­reria como um criminoso, vilipendi­ado no madeiro. Assim Jesus conclama os seus a não perderem a fé nele, porque sua gloriosa ressur­reição provaria a veracidade de suas declarações.

Em segundo lugar, eles deveriam ter fé no futuro, na espaçosa mora­dia do Pai, onde haveria um lugar preparado por ele para os seus, um lugar reservado para um povo pre­parado. A parábola ilustrativa de Cristo, no segundo versículo, traduz a ideia da imensidão e das acomo­dações imensuráveis. Godet, em sua exposição desse ponto, diz: “A ima­gem deriva-se dos imensos palácios orientais, em que há aposentos, não apenas para o soberano e os herdei­ros do trono, mas para todos os fi­lhos do rei, não importa quão nume­rosos sejam”. A descrição de Homer sobre o palácio de Príamo expressa a ideia de amplidão:

Um palácio construído com gra­ciosos portões,

E cinquenta quartos um próximo do outro…

Sentimos, contudo, que Jesus usou o termo templo (como ele ha­via chamado “A casa do Pai…”; “a casa de Deus” e “minha casa” que fi­nalmente abandonou, deixando-a desolada) como pano-de-fundo de sua ilustração a respeito da Casa do Pai nas alturas. Aquele templo, construído havia quase cinquenta anos, era uma obra-prima da cons­trução, pois tinha numerosas partes. O templo era uma casa compacta, não apenas para adoração, mas tam­bém para descanso. George Adam Smith, em sua exposição intitulada Jerusalém [Jerusalém], refere-se a ele assim: “O templo de Herodes era dividido, como o seu predecessor, em Santo dos Santos e o Santo Lugar; um pórtico, um pátio exterior com um altar para ofertas queimadas; um pátio de Israel e, em frente des­se, outro para as mulheres; e em re­dor de tudo isso o pátio dos gentios […] Aposentos para oficiais e um lu­gar de encontro para o Sinédrio. Contra as paredes foram construídos quartos extras, cerca de 38 ao todo”. Assim, o templo era feito de muitas seções e lugares, cada qual com seu próprio valor; no entanto, todas fa­ziam parte do mesmo edifício. Westcott e Hort traduzem “casa” como lar, e assim “no lar de meu Pai” adquire um aspecto vivo e amoroso. A palavra, que Jesus usou, quer di­zer “morada”, um lugar de habita­ção, enquanto “mansões” significa lugar de repouso permanente. A atu­al ocupação de Cristo, nas espaçosas moradas celestiais, é a preparação de um lugar para a sua verdadeira Igre­ja. “Vou preparar-vos lugar” – os dis­cípulos representavam a Igreja.

Em resposta ao desejo de Filipe, em obter informações sobre o cami­nho que conduz ao lugar eterno e permanente, Jesus disse que ele era o único caminho, a completa verda­de a respeito desse lugar, e a sua vida (Jo 14:6). Ele nunca levantara o véu tão alto assim. Como gostaríamos de saber mais acerca da localização do céu, do seu conteúdo e de seus ocu­pantes! Sabemos que onde quer que seja o céu, Jesus mora lá, e estar com Cristo será isso o próprio céu. Há um amplo espaço para os milhões de redimidos. No palácio do Rei não haverá lugares apertados. Façamos mais do que já realizamos pelo céu. Quem sabe, provavelmente esteja­mos mais próximos da morada do eterno descanso do que pensamos!

O terceiro remédio para seus tur­bados corações, que Jesus deu aos seus discípulos, foi a fé em sua vol­ta: “Virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver, estejais vós também”. Quan­do o lugar estiver ornamentado para a sua Igreja, e ela estiver preparada para ser arrebatada, Cristo virá dos céus a fim de levá-la consigo. Se ele não voltar pessoalmente, como dis­se que faria, então não é o Fiel, como afirmou ser. Mas Jesus jamais men­tiu. Ele voltará, como prometeu, e quando aparecer na terra com os santos, atualmente no céu ao seu lado, os santos na terra serão arrebatados juntos em um único e com­pleto corpo.

Com esperança tão bendita,

Seremos mais santos;

Mais semelhantes ao gracioso e

Glorioso Senhor,

Cuja face logo veremos.”

 

Herbert Locker, Todas as Parábolas da Bíblia, Editora Vida, p. 431 – Download disponível gratuitamente.

 

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