Teologia da Reposição

Uma Noção Confusa do Cristianismo

A maioria dos judeus não está ciente de que a Inquisição consu­miu provavelmente 100 vezes mais cristãos que judeus. Durante 15 séculos (durante 1.200 anos antes da Reforma) a Igreja Católica Romana, ao mesmo tempo em que estava matando judeus aos mi­lhares, torturava e matava cristãos aos milhões. Um dos historiado­res católicos mais respeitados do século dezenove escreveu:

Através da… atividade incansável dos papas e seus legados… a posição da Igreja era .. [que] todo desvio do ensinamento da Igreja, e toda oposição importante a qualquer ordenança eclesiástica, de­viam ser punidos com morte, e a mais cruel das mortes, pelo fogo…

Eram os papas que incentivavam bispos e padres a condenar os heterodoxos à tortura, confisco de seus bens, aprisionamento, e mor­te, e impor a execução dessa sentença às autoridades civis, sob pena de excomunhão… Todo papa confirmava ou acrescentava aos artifí­cios de seu antecessor… [envolvendo] a Inquisição, que contradizia os princípios mais simples da justiça cristã e o amor ao próximo, e te­ria sido rejeitada com horror universal na igreja primitiva.5

A maioria dessas vítimas foram verdadeiros seguidores de Cris­to, que através dos séculos recusaram aliar-se ao papa ou sua Igreja e que ao invés disso procuraram seguir a Bíblia como seu guia em todos os assuntos de fé e prática. Como resultado eles foram odia­dos, caçados, perseguidos, torturados, e massacrados pela Igreja Católica Romana em nome de Cristo, em completa oposição a tudo que Cristo ensinou. Esse falso “cristianismo” sediado em Roma se tornou tão sanguinário quanto o islamismo, e em muitos casos, pior. É necessário reconhecer com toda justiça que os ocupantes mouros de Israel foram muitas vezes mais honrados e misericor­diosos que as Cruzadas “cristãs” invasoras.

Apesar dos judeus terem ouvido falar da Reforma que ocorreu no século dezesseis sob a liderança de Martim Lutero, a maioria não sabe de sua importância. Multidões começaram a ler a Bíblia por conta própria e como resultado foram libertos do engano de que a Igreja Católica Romana tinha as chaves do céu. Ao invés de seguirem o papa, eles se tornaram seguidores de Jesus Cristo.

Os Que Amam Israel e os Judeus

Como resultado da Reforma, existem milhões de cristãos hoje, conhecidos como evangélicos, que rejeitam totalmente o catolicis­mo como um sistema religioso falso (mais pagão que cristão) de obras, rituais, purgatório, indulgências, e o sacrifício perpétuo de Cristo na missa. Desde a Reforma, esses seguidores de Jesus foram perseguidos e queimados na fogueira pelos católicos romanos às centenas de milhares. A perseguição aos protestantes ainda conti­nua até onde for possível no mundo atual onde o catolicismo roma­no esteja firmemente no controle.

Esses seguidores não-católicos de Cristo amam Israel e oram pe­la paz de Jerusalém. Longe de se envolverem em anti-semitismo ou perseguição de judeus, eles dariam suas vidas por aqueles que por nascimento físico são os irmãos de Jesus Cristo. Por exemplo, con­sidere Kaare Kristiansen, antigo líder do Partido Popular Cristão da Noruega. Quando perguntaram sobre seu antigo amor e apoio a Is­rael, ele respondeu: “Ele veio com o leite de minha mãe.” Ele “nas­ceu numa família evangélica luterana profundamente religiosa [e| cresceu ouvindo seu pai ler a Bíblia.”6 Tal amor por Israel e os ju­deus no mundo inteiro é ensinado não só no Antigo Testamento mas também no Novo e caracteriza todos os verdadeiros cristãos.

Preconceitos judeus contra Jesus Cristo e os cristãos resultam, em grande parte, da noção errada de que o catolicismo romano é o cristianismo e do não-reconhecimento de que há milhões de cris­tãos que recusam prestar lealdade a Roma. Os maus tratos da Igreja Católica aos judeus foram criados pelo ensinamento herético de que os judeus deviam ser mortos por matarem Cristo. (Nenhum ensinamento desses pode ser encontrado no Novo Testamento, e ja­mais foi praticado pela igreja primitiva). Esqueceram-se do fato de que os romanos, não os judeus, estavam no poder e poderiam ter li­bertado Jesus ao invés de executá-10. Ensinava-se que os judeus não eram mais o Povo Escolhido, mas estavam sob a ira de Deus.

O “Novo” e o “Antigo” Israel

Aos poucos desenvolveu-se a crença de que a Igreja Católica Romana era o Novo Israel e Roma a Nova Jerusalém. Roma afir­mava ser o centro espiritual do mundo e tomou o lugar de Jerusa­lém como “a cidade onde Deus colocou Seu nome”. A Roma cató­lica tomou posse de todos os títulos que pertenciam a Jerusalém: a Cidade Santa, a Cidade Eterna, a Cidade de Deus. A terra de Is­rael era vista como posse da Igreja e os papas organizaram Cruza­das para recuperarem a Terra Santa não só dos turcos, mas dos próprios judeus. Haveria “guerra santa” contra os judeus até que o “cristianismo” triunfasse.

Para competir com a promessa islâmica do paraíso aos muçul­manos que morressem lutando contra infiéis, o papa Urbano II, or­ganizador da Primeira Cruzada, prometeu uma indulgência plená­ria (entrada instantânea no céu sem nenhum tempo no purgatório) para os soldados das Cruzadas que morressem naquela grande cau­sa. Os cavaleiros e valetes que responderam com entusiasmo à pro­messa enganosa deixaram um rastro de destruição, saques, e morte no caminho para Jerusalém, procurando todo judeu que pudessem encontrar e dando-lhes a escolha entre o batismo no catolicismo ro­mano ou a morte. Uma das primeiras ações das Cruzadas ao “liber­tar” Jerusalém foi juntar os judeus na sinagoga e incendiá-la.

O papa Gregório XIII declarou que a culpa dos judeus pela crucificação de Cristo “apenas aumenta a cada geração, exigindo es­cravidão perpétua”. Uma sucessão de papas continuou a persegui­ção até Pio IX (1846-78). Em 1862, La Civilta, a voz semi-oficial do Vaticano, ecoou uma crença mantida há séculos e que continua sendo a doutrina católica romana oficial até hoje: “Como os judeus foram no passado o povo de Deus, assim são os [católicos] roma­nos sob a Nova Aliança.”7 Cansado da tirania despótica dos papas, o povo italiano finalmente se levantou contra eles. As forças da no­va Itália unida lutaram até a independência e libertaram os últimos estados papais de Pio IX, tomando finalmente a própria Roma e forçando o papa a se refugiar atrás dos muros do Vaticano. Um ex-padre que se tornou historiador escreve:

Onze dias após a queda de Roma, no dia 2 de outubro de 1870, os judeus, por decreto real, receberam a liberdade que o papado ne­gara a eles durante mais de mil e quinhentos anos. O último gueto da Europa [na época] foi desmontado.8

Quando os judeus finalmente conseguiram a sua própria pátria, foram necessários 46 anos para o Vaticano reconhecer o direito de Israel existir. Relações diplomáticas foram estabelecidas ape­nas quando ficou claro que Israel estava encaminhado um proces­so de “paz” com os palestinos e seus vizinhos árabes e que o des­tino de Jerusalém faria parte do trato. Roma precisava de algum relacionamento oficial para participar desse processo. Agora ela está se preparando para ser a guardiã espiritual de Jerusalém. Muitos líderes de Israel estão tão intoxicados com a possibilidade de paz que fecham seus olhos à longa história do anti-semitismo católico e aos juramentos islâmicos de destruir Israel. Eles fin­gem que tanto Roma quanto Meca finalmente decidiram deixar Israel viver em paz.

Teologia da Reposição

Hoje, mais de 400 anos após a Reforma, e repudiando os márti­res que deram suas vidas para se libertar de Roma, estamos vendo protestantes de mãos dadas com a mesma Igreja que mandou os seus ancestrais para as fogueiras. Como parte dessa união ecumêni­ca, cada vez mais protestantes estão assimilando as mesmas cren­ças católicas romanas que eram anátema para seus antepassados. Até mesmo a heresia de que a Igreja é Israel, também conhecida como Movimento de Identidade ou Restauração, foi aceita por grande parte dos protestantes. Uma carta enviada por membros de uma igreja conservadora evangélica explica:

A escatologia da Igreja Luterana, dos Concílios do Missouri e Winconsin, é católica por natureza: nenhum arrebatamento, nenhum mi­lênio. A igreja é Israel e as Escrituras são espiritualizadas para dar à Igreja a posse das promessas feitas a Israel. Israel como uma nação foi desprovido de qualquer importância.9

Um líder carismático influente, Earl Paulk, chegou a dizer que aqueles que dizem: “Se abençoares Israel, Deus o abençoará”, es­tão promovendo “o espírito do anticristo” 10, atribuindo o que Deus disse (“Abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem” – Gênesis 12.3) a Satanás! Paulk afirma que “tudo que foi escrito a respeito da lei e profecias sobre Israel como uma nação, agora, foi transferido ao Israel espiritual, que é o povo de Deus [i.e., a igreja]…” 11 David Chilton, um famoso teólogo refor­mado e autor reconstrucionista, escreve: “[Com] a excomunhão fi­nal de Israel em 70 d.C, quando Jerusalém foi destruída… o Reino foi transferido para Seu novo povo, a Igreja… O Reino… jamais pertencerá a um Israel nacional novamente.” 12 Outro líder cristão influente, James McKeever, escreve no seu boletim:

Nós amamos os hebreus que vivem… na nação de Israel… Mas o Senhor nos mostrou claramente que, de forma alguma, eles são Is­rael. Israel é composto por todos os crentes em Jesus Cristo…

É vitalmente importante que o corpo de Cristo perceba que ele é Is­rael e que as profecias não-cumpridas a respeito de Israel são dele para delas participar. As promessas não-cumpridas a Israel existem para que a igreja as receba. 13

Ele não poderia contradizer a Bíblia mais claramente. Não é possível que as promessas feitas por Deus a Israel possam agora ser usurpadas pela Igreja. E esses homens que querem as promes­sas que Deus fez a Israel jamais sugerem que a Igreja também her­dou as maldições que os profetas lançaram sobre Israel. No entan­to, outro autor muito bem conceituado escreve: “[Todas as promes­sas futuras de glória e bênção para Israel e Sião devem pertencer ao verdadeiro Israel [a Igreja] e a Sião celestial.” 14 Ele conclui seu estudo de The Hope of Israel (A Esperança de Israel) com a nega­ção firme de que exista em toda a Escritura “o menor apoio à dou­trina da restauração da nação judaica no futuro e sua exaltação a uma posição de senhorio sobre as nações do mundo.” 15 Uma outra citação deve ser suficiente para documentar essa aplicação errada crescente e explícita das Escrituras:

Muita gente, sincera mas erroneamente… descreve a nação de Is­rael do século vinte como “o povo escolhido de Deus”. No entanto, aqueles que crêem no Novo Testamento não podem acreditar nisso. A Versão Autorizada (King James) da Bíblia inglesa usa a palavra “escolhido” 30 vezes no Novo Testamento – mas nunca para se refe­rir à nação de Israel…

O ensinamento do Novo Testamento não mudou nos últimos 1900 anos, e se ignorarmos sua verdade corremos grande risco. A Igreja foi o Israel escolhido por Deus no primeiro século e ainda hoje é o Is­rael de sua escolha…

É o Israel espiritual, o único que ele escolheu “para ser seu próprio povo” (Êx 19.5; Dt 26.18; Tt 2.14; 1 Pedro 2.9).16

Hunt, Dave – JERUSALÉM – Um cálice de tontear – Capítulo 17 – Cristãos a favor e Contra Israel, Actual Edições, 1999, pág. 309-314.