Tribunal decide contra a Maranata

Número: 0710690-05.2019.8.07.0004

Classe: APELAÇÃO CÍVEL

Órgão julgador colegiado: 7ª Turma Cível

Órgão julgador: Gabinete da Desa. Leila Arlanch

Última distribuição: 28/07/2021

Valor da causa: R$ 20.000,00

Processo referência: 0710690-05.2019.8.07.0004

Assuntos: Direito de Imagem

Segredo de justiça? SIM

Justiça gratuita? SIM

Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO

EMENTA

CONSTITUCIONAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. ORGANIZAÇÃO RELIGIOSA. PUBLICAÇÃO EM REDE SOCIAL. MANIFESTAÇÕES TIDAS POR INVERÍDICAS E OFENSIVAS À HONRA OBJETIVA DA ENTIDADE. NÃO DEMONSTRAÇÃO. PESSOA JURÍDICA PÚBLICA, OBJETO DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL. CARÁTER OPINATIVO E CRÍTICO RESPEITADO. DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. DANO MORAL AFASTADO. RECURSO DESPROVIDO.

  1. Para fins de propagação de informações e construção do juízo crítico e opinativo, assiste à coletividade o direito à livre manifestação do pensamento e à liberdade de imprensa, sendo resguardado ao indivíduo o direito à vida privada, à honra, à imagem e à liberdade de consciência/crença, por meio da difusão de informações íntegras, garantindo, em caso de excessos, a correspondente indenização, além do direito de resposta (CRFB, arts. 5º, IV, V, VI, IX, X, e 220; Lei n. 13.188/15).
  1. Conforme Súmula n. 227/STJ, a pessoa jurídica de direito privado, como é o caso da organização religiosa (CC, art. 44, IV), pode sofrer dano moral, decorrente do abalo de sua honra objetiva (bom nome e/ou reputação, probidade etc.), cabendo a ela comprovar essa violação (CPC, art. 373, I).
  1. Se os comentários realizados em rede social estão relacionados à prática da doutrina espiritual pregada pela entidade religiosa e à conduta de seus dirigentes, com base em decisões judiciais e em notícias divulgadas na mídia acerca de investigação policial envolvendo a suposta prática de crimes mediante desvio de dízimos e contribuições oferecidas pelos fiéis, inexiste mácula à sua honra objetiva. A menção a esses acontecimentos efetivamente noticiados não exorbita a liberdade de manifestação do pensamento, não redundando em dano moral.
  1. A atividade finalística de uma organização religiosa demanda o dever de probidade, estando sujeita à fiscalização popular e a eventuais questionamentos, ainda que exteriorizados por meio de comentários contundentes e irônicos, como é o caso, discurso este que faz parte do pluralismo de ideias da democracia e do livre exercício da liberdade de expressão.
  1. Recurso conhecido e desprovido.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 7ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, LEILA ARLANCH – Relatora, GISLENE PINHEIRO – 1º Vogal e CRUZ MACEDO – 2º Vogal, sob a Presidência da Senhora Desembargadora LEILA ARLANCH, em proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. DESPROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 20 de Outubro de 2021

Desembargadora LEILA ARLANCH

Presidente e Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c danos morais e tutela de urgência proposta por IGREJA CRISTA MARANATA PRESBITERIO ESPIRITO SANTENSE em desfavor de JOAQUIM WALLACE DE SOUZA.

A autora esclarece ser uma instituição religiosa sucessora da Igreja Cristã Presbiteriana, fundada em 22/1/1968, de muito respeito, com mais de cinco mil templos no Brasil, realizando trabalho de seriedade e comprometimento. Pondera que o réu mantém uma conta no Facebook com o fito de propagar a intolerância religiosa, atentar contra o sentimento religioso da Igreja, seus líderes e fiéis, mediante conteúdo extremamente agressivo e hostil, com a disseminação de publicações ofensivas e inverídicas, contendo acusações gravíssimas e infundadas. Aduz que o réu é autor de 19 (dezenove) postagens (ID 27665618 a 27665638), no interregno de 2/12/2019 a 3/12/2019, e usa indevidamente a marca da instituição com acréscimos indevidos que maculam a imagem da autora. Tece arrazoado sobre a ponderação dos direitos constitucionais envolvidos e defende que houve ofensa a sua honra objetiva, para fins de pagamento de danos morais, retirada das postagens e retratação.

A decisão de ID 27665639 deferiu parcialmente a tutela provisória de urgência, nos seguintes termos:

(…) Ante o exposto, DEFIRO EM PARTE a tutela provisória de urgência para determinar ao réu que promova, no prazo de 24 horas, a retirada das publicações ofensivas à parte autora e a seus líderes, descritas no item 8 desta exordial e postadas entre 02/12/2019 e 03/12/2019 na página da rede social FACEBOOK, bem como se abstenha de fazer o uso indevido da marca da requerente como foto do seu perfil do FACEBOOK, como também esteja obstado de fazer novas publicações ofensivas à imagem da autora e de seus líderes, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 até o limite de R$ 20.000,00.

Sem prejuízo, oficie-se com urgência ao FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE BRASIL, determinando que a empresa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, exclua as postagens inseridas pelo réu entre os dias 02/12/2019 e 03/12/2019, conforme quadro ID 51461726, páginas 3 a 7 (que deverão seguir em anexo). (…).

Contra essa decisão, o réu interpôs o Agravo de Instrumento n. 0702021-38.2020.8.07.0000, o qual foi desprovido (ID 27665663, 27665691 e 27665732).

O réu apresentou contestação e reconvenção (ID 27665658). Suscita preliminar de incompetência territorial. Sustenta a caracterização da litigância de má-fé uma vez que “é inegável a sua consciência quanto à repulsa do próprio Poder Judiciário quanto às suas intenções de intimidação, ajuizando ações cíveis e penais, imputando a terceiros crimes contra a honra ou mesmo de obter indenizações com fatos e alegações semelhantes ao que se observa neste feito. Exemplo disso são as 16 ações contra veículos de comunicação, indicadas alhures, bem como as diversas outras ações intentadas contra cidadãos de bem”.

Argumenta que a autora possui reputação manchada, demonstrada por meio de matérias jornalísticas, de reportagens do Jornal Nacional e da Rede Globo de Televisão. Afirma ser notória a insatisfação de centenas de pessoas com os escândalos provocados pela liderança da autora, exteriorizada em redes sociais. Destaca que, “sendo este fato de conhecimento público, associado ao fato de inexistir dolo específico do requerido com o propósito de manchar a reputação da autora, a propositura de ações criminais contra diversos requeridos e a pretensão de indenização por danos morais é antijurídico, abusivo e doloso.”

Refuta o preenchimento dos requisitos para o deferimento da tutela de urgência, ante a irreversibilidade da medida, uma vez que teve a conta do Facebook inativada, além da inexistência de violação à imagem da autora. Em sede de reconvenção, defende que vem sendo cerceado o seu direito de livre expressão do pensamento e que a atitude da autora corresponde a verdadeira censura, ensejando danos morais na monta de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

O pedido de gratuidade de justiça formulado pelo réu foi deferido e a reconvenção recebida (ID 27665673).

A autora apresentou réplica e contestação à reconvenção (ID 27665676 e ID 27665687).

Impugna o deferimento da gratuidade de justiça. Reitera os argumentos da petição inicial.

Em sede de contestação à reconvenção, defende a inexistência de prova do dano moral alegado.

O réu apresentou réplica na reconvenção e juntou documentos (ID 27665695).

As partes foram intimadas para especificar as provas que pretendiam produzir (ID 27665692).

Decisão saneadora de ID 27665733 rejeitou a preliminar de incompetência, a impugnação ao deferimento da gratuidade de justiça em favor do réu e o pedido de produção de prova oral.

Em 1º Grau (ID 27665739), os pedidos iniciais e reconvencionais foram julgados improcedentes, nos seguintes termos:

 (…) III – DISPOSITIVO

 Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por IGREJA CRISTÃ MARANATA PRESBITÉRIO ESPÍRITO SANTENSE em desfavor de JOAQUIM WALLACE DE OUZA, partes qualificadas nos autos. Declaro, pois, resolvido o mérito da demanda principal, nos termos do art. 487, inciso I, CPC.

Em razão da sucumbência e bem analisados o grau de zelo dos profissionais envolvidos, o lugar de prestação do serviço (fácil acesso), a natureza e a importância da causa (complexidade normal), o trabalho realizado pelos advogados e o tempo exigido para o seu serviço (sem intercorrências), condeno a autora ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do CPC.

De outro lado, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos reconvencionais formulados por JOAQUIM WALLACE DE SOUZA em desfavor de IGREJA CRISTÃ MARANATA PRESBITÉRIO ESPÍRITO SANTENSE, partes qualificadas nos autos.

Declaro, pois, resolvido o mérito da reconvenção, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Em razão da sucumbência na reconvenção e bem analisados o grau de zelo dos profissionais envolvidos, o lugar de prestação do serviço (fácil acesso), a natureza e a importância da causa (complexidade normal), o trabalho realizado pelos advogados e o tempo exigido para o seu serviço (sem intercorrências), condeno o réu/reconvinte ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do CPC, devendo-se observar que o réu é beneficiário de gratuidade de justiça.

Derradeiramente, considerando o conteúdo do art. 6º do CPC, em especial o dever de cooperação que permeia o processo civil brasileiro, concito as partes para que, diante da publicação da presente sentença, zelem pelo bom desenvolvimento processual, observando, especialmente o que tange o recurso de Embargos de Declaração, o exato conteúdo do art. 1.022 do diploma processual, evitando, desse modo, a interposição de recurso incabível.

Diante de tal ponderação, ficam advertidas as partes, desde já, que oposição de Embargos de Declaração manifestamente protelatórios, em especial os que visem unicamente a reanálise de provas e/ou o rejulgamento da causa e/ou arbitramento de honorários e/ou danos morais, será alvo de sancionamento, na forma do art. 1.026, § 2º do mesmo diploma, na esteira dos precedentes do Eg. TJDFT (Acórdãos 1165374, 1164817, 1159367, entre outros).

Após o trânsito em julgado, não havendo outros requerimentos, dê-se baixa e arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo.

Sentença prolatada em atuação no Núcleo Permanente de Gestão de Metas do Primeiro Grau – NUPMETAS – 1, instituído pela Portaria Conjunta nº 33, de 13/05/2013.

Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se. (…).

Contra o pronunciamento judicial, a autora/reconvinda interpõe a apelação de ID 27665746.

Reafirma ser instituição de muito respeito, atingindo mais de cinco mil templos no Brasil, sendo sucessora da Igreja Cristã Presbiteriana, fundada em 22/1/1968.

Assevera que vem sendo alvo de constantes ataques, desmotivados, por parte de publicações efetuadas pelo réu apelado no Facebook com o único objetivo de ofender a imagem e a honra, de propagar intolerância religiosa, e atentar contra o sentimento religioso da ora apelante, seus líderes (já idosos) e fiéis. Destaca a utilização de linguagem agressiva, com acusações sem qualquer comprovação que extrapolam os limites da liberdade de expressão. Aduz que há insinuação por parte do réu apelado, sem qualquer prova ou condenação judicial transitada em julgado, que a ora recorrente desvia dízimos, além da utilização de expressões como “farsa religiosa criminosa”, “uma grande máquina de lavar dinheiro”, o que também não se pode admitir.

Pondera que a decisão que tratou da tutela de urgência reconheceu a abusividade nas postagens efetuadas. Nesses termos, requer o conhecimento e provimento do apelo para fins de reforma da sentença, remoção das mensagens, retratação pública e condenação por danos morais, na monta de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), conforme arts. 5º, IV, V, VI, VIII, X e XVIII, da CRFB; 18 e 19 da Lei n. 12.965/14 (Marco Civil da Internet); 12 e 17 do CC e 13 Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Preparo em ID 27665747 e 27665748.

Contrarrazões do réu/reconvinte em ID 27665753, pontuando que seu direito à liberdade de pensamento está amparado na Constituição da República (arts. 5º, IV e 220) e que a autora/reconvinda é organização religiosa pública e com responsabilidade social, estando sujeita a críticas e manifestações sem que isso represente mácula ao direito de crença ou à liberdade religiosa, notadamente porque as postagens foram realizadas em sua página pessoal, para fins de desprovimento do apelo e arbitramento de honorários recursais (CPC, art. 85, § 11).

É o relatório. 

VOTOS

 A Senhora Desembargadora LEILA ARLANCH – Relatora

Conheço do recurso, porque presentes os pressupostos de sua admissibilidade.

Trata-se de apelação interposta pela autora/reconvinda, IGREJA CRISTA MARANATA PRESBITERIO ESPIRITO SANTENSE, contra a sentença de ID 27665739 que, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c danos morais ajuizada em desfavor do réu/reconvinte, JOAQUIM WALLACE DE SOUZA, embasada em mácula a direitos da personalidade em razão de publicações no Facebook tidas por ofensivas a sua imagem e honra, com o intuito de propagar intolerância religiosa e atentar contra o sentimento religioso da instituição, de seus líderes (já idosos) e fiéis, julgou improcedentes os pedidos iniciais e reconvencionais, nos seguintes termos:

 (…) III – DISPOSITIVO

 Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por IGREJA CRISTÃ MARANATA PRESBITÉRIO ESPÍRITO SANTENSE em desfavor de JOAQUIM WALLACE DE OUZA, partes qualificadas nos autos.

Declaro, pois, resolvido o mérito da demanda principal, nos termos do art. 487, inciso I, CPC.

Em razão da sucumbência e bem analisados o grau de zelo dos profissionais envolvidos, o lugar de prestação do serviço (fácil acesso), a natureza e a importância da causa (complexidade normal), o trabalho realizado pelos advogados e o tempo exigido para o seu serviço (sem intercorrências), condeno a autora ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do CPC.

De outro lado, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos reconvencionais formulados por JOAQUIM WALLACE DE SOUZA em desfavor de IGREJA CRISTÃ MARANATA PRESBITÉRIO ESPÍRITO SANTENSE, partes qualificadas nos autos.

Declaro, pois, resolvido o mérito da reconvenção, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC.

Em razão da sucumbência na reconvenção e bem analisados o grau de zelo dos profissionais envolvidos, o lugar de prestação do serviço (fácil acesso), a natureza e a importância da causa (complexidade normal), o trabalho realizado pelos advogados e o tempo exigido para o seu serviço (sem intercorrências), condeno o réu/reconvinte ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do CPC, devendo-se observar que o réu é beneficiário de gratuidade de justiça.

Derradeiramente, considerando o conteúdo do art. 6º do CPC, em especial o dever de cooperação que permeia o processo civil brasileiro, concito as partes para que, diante da publicação da presente sentença, zelem pelo bom desenvolvimento processual, observando, especialmente no que tange o recurso de Embargos de Declaração, o exato conteúdo do art. 1.022 do diploma processual, evitando, desse modo, a interposição de recurso incabível.

Diante de tal ponderação, ficam advertidas as partes, desde já, que oposição de Embargos de Declaração manifestamente protelatórios, em especial os que visem unicamente a reanálise de provas e/ou o rejulgamento da causa e/ou arbitramento de honorários e/ou danos morais, será alvo de sancionamento, na forma do art. 1.026, § 2º do mesmo diploma, na esteira dos precedentes do Eg. TJDFT (Acórdãos 1165374, 1164817, 1159367, entre outros).

Após o trânsito em julgado, não havendo outros requerimentos, dê-se baixa e arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo.

Sentença prolatada em atuação no Núcleo Permanente de Gestão de Metas do Primeiro Grau – NUPMETAS – 1, instituído pela Portaria Conjunta nº 33, de 13/05/2013.

Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se. (…).

Em suas razões recursais (ID 27665746), a autora/reconvinda defende, em suma, a configuração de abalo a direitos da personalidade, para fins de condenação do réu em danos morais, remoção das mensagens postadas e retratação pública, pois: a) é instituição de muito respeito, atingindo mais de cinco mil templos no Brasil, sendo continuação e sucessora da Igreja Cristã Presbiteriana, fundada em 22/1/1968; b) foi alvo de constantes ataques, desmotivados, por parte de publicações efetuadas pelo apelado no Facebook com o único objetivo de ofender sua imagem e honra, de propagar intolerância religiosa e atentar contra o sentimento religioso de seus líderes e fiéis, mediante a utilização de linguagem agressiva, com acusações sem qualquer comprovação, extrapolando os limites da liberdade de expressão (CRFB, art. 5º, IV, V, VI, VIII, X e XVIII; Lei n. 12.965/14; CC, arts. 12 e 17; Convenção Americana sobre Direitos Humanos); c) há menção inverídica a desvio de dízimos, além da utilização de expressões como “farsa religiosa criminosa”, “uma grande máquina de lavar dinheiro”.

Tais argumentos são refutados pelo réu/reconvinte/apelado, o qual entende estar albergado pela liberdade de pensamento.

Adiante-se, desde já, que, ao contrário do defendido no recurso, a decisão afeta à tutela provisória de ID 27665639 é de natureza precária, estando assentada em cognição sumária, não tendo, em momento algum, aferido eventual lesividade das postagens.

A matéria litigiosa envolve ponderação entre o direito à liberdade de expressão e manifestação e os direitos de imagem/honra e de proteção à crença e às liturgias religiosas, todos protegidos pela Constituição da República (arts. 5º, IV, V, VI, IX, X, e 220).

No âmbito da internet, destaque-se a Lei n. 12.965/14, conhecida como “Marco Civil da Internet”, a qual estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso desse meio de comunicação, tendo como fundamento o respeito à liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento, além da proteção à intimidade e à privacidade, resguardando eventual indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (vide arts. 2º; 3º, I e II; 4º, II; 7º, I; e 8º).

Se, por um lado, assiste à coletividade o direito à livre manifestação do pensamento e à liberdade de imprensa, para fins de propagação de informações e construção do juízo crítico e opinativo, indispensáveis ao regime democrático; por outro lado, assiste o direito à vida privada, à honra, à imagem e à liberdade de consciência/crença, por meio da difusão de informações íntegras, garantindo, em caso de excessos, a correspondente indenização, além do direito de resposta (CRFB, arts. 5º, IV, V, VI, IX, X, e 220; Lei n. 13.188/15).

Dessa forma, é necessário, à luz do caso, ponderar esses direitos fundamentais, a fim de garantir que nenhum deles tenha seu conteúdo essencial esvaziado, de forma a não caracterizar censura e, de outro vértice, o desrespeito a direitos da personalidade.

Cumpre salientar que o art. 52 do CC, de modo expresso, disciplina que a proteção dos direitos da personalidade é aplicada, no que couber, às pessoas jurídicas. Por conseguinte, não se discute que a pessoa jurídica de direito privado (CC, art. 44, IV), como é o caso da organização religiosa autora recorrente, pode vir a sofrer dano moral, decorrente do abalo de sua honra objetiva (bom nome e/ou reputação, probidade etc.), cabendo a ela comprovar essa violação (CPC, art. 373, I). Inclusive, tal entendimento encontra-se sedimentado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, conforme Súmula n. 227: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.

Diante dessa perspectiva de ponderação de valores, da análise das 19 (dezenove) postagens no Facebook (ID 27665618 a 27665638), não há falar em ofensa à honra objetiva da organização religiosa autora recorrente.

Como bem ponderado em 1º Grau, o réu apelado, no exercício do seu direito constitucional de livre manifestação do pensamento, teceu comentários relacionados à prática da doutrina espiritual pregada pela autora e à conduta de seus dirigentes, com base em notícias divulgadas na mídia acerca de investigação policial envolvendo os líderes daquela comunidade religiosa por suposta prática de crimes mediante desvio de dízimos e contribuições oferecidas pelos fiéis, bem como de decisões judiciais proferidas pelo STJ no RHC n. 44730/ES e pelo STF, nos HC n. 123019, n. 130219 e n. 126536 (http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=311095&ori=1), não havendo falar em mácula à sua honra objetiva.

São declarações[1] do réu apelado a respeito de sua insatisfação com a comunidade religiosa em questão, no campo de sua liberdade de expressão, por meio de críticas ácidas e mediante a utilização de premissas fundadas em passagens bíblicas[2], dentro de um contexto investigatório divulgado na mídia envolvendo a suposta prática de crimes por seus líderes, inerente ao debate democrático.

Ou seja, não se trata de discurso de ódio relacionado à intolerância religiosa, mas sim de descontentamentos pessoais em razão das acusações de desvio de dízimos. A menção a esses acontecimentos efetivamente noticiados não exorbita a liberdade de manifestação do pensamento.

Rememore-se se tratar de entidade religiosa de alcance nacional, cuja atividade finalística demanda o dever de probidade, estando sujeita à fiscalização popular e a eventuais questionamentos, ainda que exteriorizados por meio de comentários ácidos, irônicos e em tom de deboche, como é o caso dos autos, discurso este que faz parte do pluralismo de ideias da democracia e do livre exercício da liberdade de expressão.

Reforça essa situação o fato de o réu apelado ter utilizado, em sua “foto de perfil” do Facebook, uma imagem atrelada à comunidade religiosa, peculiaridade esta que não transmuda a natureza do seu direito à liberdade de expressão. O tom humorístico e sarcástico dessa ilustração não redunda em dano moral, haja vista se tratar de instituição pública que livremente difunde suas ideias religiosas nacionalmente, cujo direito de imagem sofre flexibilização.

 O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. (ADI 4451, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 21/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-044 DIVULG 01-03-2019 PUBLIC 06-03-2019)

Não cabe ao Judiciário realizar o controle da qualidade ou do acerto da manifestação do réu apelado sob o aspecto teológico ou moral, sob pena de materializar um mecanismo de censura.

Em reforço, com as devidas adaptações:

 CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER E DE INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO EM REDE SOCIAL. LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. ABUSO NÃO CONFIGURADO. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA.

1. A Constituição Federal, em seus arts. 5º, IV e XIV, e 220, garante a livre manifestação do pensamento e a liberdade de expressão, como formas de satisfação do direito coletivo de informação, sendo indispensável ao regime democrático.  2. É certo que os direitos fundamentais não são absolutos e irrestritos, de modo que, havendo aparente colisão entre eles, como é o caso dos direitos da personalidade e da liberdade de expressão, cabe ao julgador sopesar e ponderar os interesses em conflito no caso concreto, mediante a utilização da proporcionalidade.  3. Se, analisando o contexto dos autos, tem-se que o Réu não desbordou do seu direito de expressão e opinião, ao expor os fatos que supostamente teria vivenciado, embora possa ter em algum momento se exaltado na colocação das críticas e insatisfações, não há que se falar em abuso do direito à liberdade de expressão. 4. Recurso de apelação conhecido e não provido. (Acórdão 1355137, 07112504420198070004, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 21/7/2021, publicado no DJE: 29/7/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.) (g.n.)

Desse modo, não se observando violação à honra objetiva ou à imagem da organização religiosa autora recorrente, não há falar em danos morais, tampouco em retirada do conteúdo ou retratação, tal qual decidido em 1º Grau. Aos fundamentos da sentença, inclusive, também se reporta como razões de decidir.

Posto isso, NEGO PROVIMENTO à apelação da autora.

Diante do trabalho adicional desenvolvido nesta Instância Recursal (CPC, art. 85, § 11), majoro os honorários fixados em 1º Grau para 11% (onze por cento) do valor atualizado da causa, diferença esta a cargo da autora apelante.

É como voto.

[1] V.g. “O outro espírito de engano da Maranata” (ID 27665618); “A Maranata pagou milhões de reais para pregar as mentiras do gedelti, que fiasco, quanta vergonha” (ID 27665619); “Milhões de pessoas conheceram a quadrilha organizada da Maranata pela tv aberta, que benção” (ID 27665621); “Foi a Maranata ir pra a tv aberta que tá só levando pancada, o povo reconheceu as mentiras” (ID 27665622); “A pergunta é; a Maranata tocou as trombetas ou as tornozeleiras?” (ID 27665623); “será que prende o anjo vacilão da Maranata” (ID 27665626); “anjo vacilão, dá visão pra desviar dízimos, erra as trombetas, GG ta certo, errado é o anjo, esse anjo otário, tem que demiti-lo” (ID 27665628); “A liderança da Maranata zomba da justiça, do ministério público e, por fim zomba de Deus” (ID 27665629); “Maranata 50 anos de engano” (ID 27665630); “farsa religiosa da Maranata” (ID 27665631); “quadrilha organizada da Maranata” (ID 27665638); etc.

[2] “Mt 23:15: ‘hipócritas! Pois que percorreis o mar e a terra para fazer um convertido; e, depois de o terdes feito, o fazeis filho do inferno duas vezes mais do que vós.’” (ID 27665625)

Senhora Desembargadora GISLENE PINHEIRO – 1º Vogal

Com o relator

O Senhor Desembargador CRUZ MACEDO – 2º Vogal

Com o relator

DECISÃO

 CONHECIDO. DESPROVIDO. UNÂNIME.

……….

NOTAS

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A Carta Magna protege a liberdade de opinião e de pensamento.

Aqui não é lugar para calúnias e difamações. Discutimos doutrinas, heresias e ideias à luz das Doutrinas Fundamentais como um dos capítulos da Teologia.

Caso faça cópia dos textos publicados mencione a fonte. Este artigo

http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2021/10/tribunal-decide-contra-a-maranata/

Em nome da ética democrática, que a data original e origem da publicação sejam identificadas. Nada custa um aviso sobre a livre publicação, para nosso simples conhecimento.

Escrever em CAIXA ALTA (letras maiúsculas) é deselegante. Evitem postagens fora do FOCO do artigo.

Imagens colocadas nos artigos como ilustração foram retiradas da Internet (Google) e também dos textos aqui postados, presumindo serem de domínio público. No caso que haja alguma imagem sem os créditos devidos não foi intencional; e, deste modo agradeceria em nos avisar que colocaremos os créditos.

2 Respostas para “Tribunal decide contra a Maranata”

  1. Erros de Gedelti Gueiros ficaram na História:

    i) agir com autodefesa, avareza e dissimulação;

    ii) contrariar o que Deus disse do jeito que Ele disse;

    iii) demandar contra questionadores;

    iv) depender de falsos profetas paridos no sistema;

    v) desviar bens imóveis e ofertas voluntárias;

    vi) imaginar que os Judas palacianos – ele inclusive – ficariam livres de questionamentos nas redes sociais e de sentenças;

    vii) não se arrepender das iniquidades e do orgulho religioso;

    viii) recorrer de decisões judiciais perdidas.

    Portanto, insensatez, loucura e soberba é o resultado.

    Se não quis dar atenção ao que Deus disse, do jeito que Ele disse, o agravo foi maior.

    Se perguntar não ofender: Judas, cadê o dinheiro?

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2013/01/judas-cade-o-dinheiro/

    Sei de algo que faz pensar: tudo quanto é empreendido sem contar com Deus só pode durar o tempo presente; mas não pode de modo algum alongar-se para a eternidade.

    “O SENHOR é minha bandeira.”

    CV

  2. Em dois artigos que antecederam (observem as datas) o desastroso desfile do cabeça da oligarquia (governo de família e amigos), no dia 10.03.2013, domingo, na Pç. do Papa João Paulo II, previ que Gedelti desceria do palanque e mergulharia em sombras e vitupério:

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/o-desfile-final/

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2013/03/o-fio-de-escarlate-nao-aguentou/

    O gigantismo do boi (quem lê entenda) o condenou ao fracasso. Nem evangélica, nem pentecostal, nem protestante: esta é a igreja-do-jeito-que-o-chefe-icemita-quer. Por oportuno, quanto mais os Órgãos Públicos investigam mais aparece para investigar. Porém, ao Poder Público não será possível mergulhar onde não consegue (e existem coisas escondidas) por ser falível; mas será levantado no Juízo do Grande Dia. Sentenças!!! Terrível!

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2020/08/da-experiencia-de-obra-ao-fracasso-religioso/

    O poder camaleônico inspira as ações dos falsos profetas mancumunados com maus pastores que aprendem com o olhar caolho do dominador do rebanho. Como entender que esses homens muito religiosos estão inspirados por Mamom?

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2011/05/dominadores-do-rebanho-de-deus/

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/2011/04/poder-camaleonico/

    Por acaso, mitos religiosos os livrarão das penas?

    Que tristeza!

    http://cavaleiroveloz.com.br/index.php/apelo-a-justica-de-deus-contra-os-malfeitores/

    “O SENHOR é minha bandeira.”

    CV.

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